LGPD em Advocacia: Impactos e Jurisprudência Atual

LGPD em Advocacia: Impactos e Jurisprudência Atual
Créditos: 2025-08-28T10:01:05.060-03:00 · Foto gerada pela IA

LGPD em Advocacia: Impactos e Jurisprudência Atual

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) chegou para mudar a forma como empresas e profissionais lidam com informações pessoais no Brasil. Para os escritórios de advocacia, que manuseiam um volume significativo e muitas vezes sensível de dados de clientes, parceiros e colaboradores, essa adaptação não é apenas uma formalidade, mas uma verdadeira revolução na gestão e na prática jurídica.

Imagine a quantidade de informações que transita diariamente por uma banca: dados de identificação, financeiros, de saúde, patrimoniais, e até mesmo informações que revelam a intimidade de uma pessoa, todos cruciais para a condução de processos. A LGPD impõe novas responsabilidades e desafios, exigindo uma reestruturação de processos internos e, mais importante, uma nova cultura de privacidade.

Neste artigo, vamos desvendar os principais desafios que a LGPD apresenta para a advocacia, as adaptações práticas indispensáveis e, crucially, como a jurisprudência atual tem se posicionado sobre o tema, oferecendo um guia prático para advogados e gestores que buscam conformidade e segurança jurídica. Acompanhe!

O Que Significa a LGPD para Escritórios de Advocacia?

Em sua essência, a LGPD (Lei nº 13.709/2018) busca proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade, além do livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, regulamentando o tratamento de dados pessoais. Para os escritórios de advocacia, isso significa que cada etapa do ciclo de vida de um dado – da coleta ao descarte – deve ser realizada com base em um fundamento legal explícito e seguindo princípios como finalidade, necessidade, transparência e segurança.

Um escritório de advocacia atua tanto como Controlador de Dados (definindo como e por que os dados serão tratados) quanto, em certas situações, como Operador de Dados (tratando dados em nome de outro controlador, como uma empresa cliente). Essa dualidade exige um cuidado redobrado e uma clara definição de papéis e responsabilidades.

Desde a entrevista inicial com um cliente, passando pela elaboração de petições, pelo armazenamento de documentos e pela comunicação com tribunais e outras partes, há uma constante troca e manuseio de dados pessoais e, muitas vezes, de dados pessoais sensíveis (aqueles sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, saúde, vida sexual, genéticos ou biométricos). A sensibilidade desses dados eleva o nível de exigência de proteção e as consequências de um eventual descumprimento.

A LGPD estabelece dez bases legais que autorizam o tratamento de dados pessoais. Para os escritórios de advocacia, algumas delas são mais relevantes e frequentemente utilizadas:

  • Execução de Contrato: O tratamento de dados é essencial para a prestação de serviços jurídicos contratados pelo cliente.
  • Cumprimento de Obrigação Legal ou Regulatória: Muitas leis e regulamentos exigem que o escritório colete e mantenha certos dados (e.g., leis fiscais, normas da OAB, KYC – Know Your Client).
  • Exercício Regular de Direitos em Processo Judicial, Administrativo ou Arbitral: Esta é uma base legal fundamental, pois o tratamento de dados para defender os interesses do cliente em litígios é a própria essência da advocacia.
  • Legítimo Interesse: Pode ser utilizado em situações específicas, como para comunicações de marketing personalizadas (com cautela) ou para melhorar a prestação de serviços, desde que não viole os direitos e liberdades fundamentais do titular.
  • Consentimento: Embora não seja a base mais comum na advocacia contenciosa (dada a base de exercício regular de direitos), o consentimento pode ser crucial em atividades específicas, como para a divulgação de um caso (com a autorização do cliente) ou para finalidades secundárias que não se enquadrem nas outras bases.

É crucial que o escritório identifique e documente a base legal para cada tipo de tratamento de dados que realiza. Isso não só garante a conformidade, mas também permite que o titular compreenda o motivo pelo qual seus dados estão sendo utilizados.

Os Direitos dos Titulares e o Dever do Advogado

A LGPD empodera os titulares de dados, garantindo-lhes diversos direitos, como:

  • Acesso aos dados.
  • Correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados.
  • Anonimização, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários, excessivos ou tratados em desconformidade com a LGPD.
  • Portabilidade dos dados.
  • Eliminação dos dados pessoais tratados com consentimento do titular.
  • Revogação do consentimento, quando aplicável.

Advogados precisam estar preparados para atender a essas solicitações de forma transparente e eficiente, respeitando os prazos legais. A falha em fazê-lo pode acarretar sanções e prejuízos à reputação do escritório.

Desafios Práticos e Adaptações Necessárias

A adequação à LGPD não é um "projeto com fim", mas um processo contínuo que exige planejamento e execução de diversas ações:

  1. Mapeamento de Dados: O primeiro passo é identificar onde os dados pessoais são coletados, armazenados, processados e compartilhados dentro do escritório, desde a recepção até o departamento financeiro e a equipe de advogados.
  2. Revisão de Documentos: Atualização de contratos com clientes, fornecedores e colaboradores para incluir cláusulas de proteção de dados. Elaboração de uma Política de Privacidade clara e acessível e, se for o caso, termos de uso para sites e portais.
  3. Medidas de Segurança: Implementação de barreiras técnicas (criptografia, firewalls, controle de acesso) e administrativas (políticas internas, treinamentos) para proteger os dados contra acessos não autorizados, perdas ou vazamentos.
  4. Treinamento e Conscientização: Todos os membros do escritório, desde estagiários a sócios, precisam ser treinados sobre a LGPD e a importância da proteção de dados. Uma cultura de privacidade é tão vital quanto as ferramentas tecnológicas.
  5. Plano de Resposta a Incidentes: Desenvolver um protocolo claro para o caso de ocorrer um vazamento de dados ou outro incidente de segurança. Saber como agir rapidamente e notificar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e os titulares, quando necessário, é fundamental.
  6. Nomeação de Encarregado de Dados (DPO): Em muitos casos, a lei exige a nomeação de um DPO (Data Protection Officer) para atuar como ponte entre o escritório, os titulares de dados e a ANPD. Mesmo que não seja obrigatório, é uma boa prática.

Essas adaptações demandam investimento de tempo e recursos, mas são indispensáveis para mitigar riscos e fortalecer a confiança dos clientes.

A Jurisprudência Atual: Como os Tribunais Estão Encarando a LGPD em Bancas

Ainda que o volume de decisões judiciais diretamente envolvendo escritórios de advocacia por violações da LGPD não seja massivo como em outros setores, a jurisprudência tem demonstrado uma crescente sensibilidade aos direitos dos titulares de dados e uma postura cada vez mais rigorosa na aplicação da lei. As tendências que observamos em outros segmentos, certamente, se estenderão e impactarão a advocacia.

Os tribunais brasileiros têm reforçado a importância da transparência e da responsabilização. Decisões têm penalizado empresas que não conseguem demonstrar a base legal para o tratamento dos dados, que falham em proteger as informações contra vazamentos ou que ignoram as solicitações dos titulares. Para os escritórios, isso significa que a mera alegação de sigilo profissional ou de cumprimento de obrigação legal pode não ser suficiente se não houver um sistema robusto de governança de dados por trás.

Vejamos algumas situações e princípios que a jurisprudência tem solidificado, e como elas se refletem na atuação jurídica:

1. Vazamento de Dados e Responsabilidade Objetiva

Em diversos casos de vazamento de dados, mesmo em setores não diretamente jurídicos, os tribunais têm adotado a responsabilidade objetiva ou, no mínimo, interpretado de forma estrita o dever de segurança do controlador. Isso implica que, uma vez comprovado o dano decorrente do vazamento, a empresa (ou o escritório) pode ser responsabilizada independentemente da prova de culpa, a menos que comprove que o dano não ocorreu por sua falha ou que o evento foi totalmente imprevisível e inevitável.

Para um escritório, um vazamento de dados de clientes, que frequentemente contém informações sensíveis sobre litígios, condição financeira ou saúde, pode gerar danos morais e materiais substanciais. A jurisprudência tem valorizado a capacidade da empresa de demonstrar que implementou todas as medidas de segurança razoáveis e proativas para evitar o incidente.

A proteção dos dados pessoais dos clientes não é apenas uma exigência legal, mas um imperativo ético e um diferencial competitivo. A ausência de medidas adequadas pode resultar em graves sanções e perda de credibilidade, como já se observa em decisões que imputam responsabilidade por incidentes de segurança.

2. Atendimento aos Direitos dos Titulares

Há decisões que impõem multas diárias e outras penalidades para empresas que se recusam ou demoram injustificadamente para atender aos pedidos dos titulares de dados (e.g., acesso, exclusão). Um escritório de advocacia deve ter canais claros e eficientes para lidar com essas requisições, documentando cada interação.

3. "Legítimo Interesse" e o Princípio da Expectativa do Titular

O uso da base legal do "legítimo interesse" tem sido olhado com cautela pelos tribunais. A jurisprudência exige que o controlador demonstre claramente o benefício do tratamento, os riscos para o titular e que realize o "teste de legítimo interesse", ponderando o interesse do controlador com os direitos e liberdades fundamentais do titular. Para o escritório, isso significa que usar dados de clientes para finalidades "secundárias" (como marketing de conteúdo não explicitamente autorizado) exige uma análise rigorosa e uma comunicação transparente.

4. O Código de Ética e a LGPD

É importante notar que a LGPD complementa e fortalece o Código de Ética e Disciplina da OAB, que já estabelece o dever de sigilo profissional do advogado. A quebra do sigilo, mesmo que por falha na segurança dos dados, pode gerar não só as sanções da LGPD, mas também sanções disciplinares da OAB. A jurisprudência, ao lidar com a LGPD, implicitamente reforça a importância desses preceitos éticos.

Em suma, os tribunais estão sinalizando que a conformidade com a LGPD não é uma opção, mas uma obrigação que exige proatividade, documentação e uma cultura de respeito à privacidade. Escritórios que negligenciam essas tendências correm riscos significativos.

Por Que a Conformidade com a LGPD é Inegociável para Advogados Agora?

A adequação à LGPD vai muito além de evitar multas – que podem chegar a 2% do faturamento anual, limitadas a R$ 50 milhões por infração, além de outras sanções administrativas aplicadas pela ANPD. A conformidade é inegociável por diversas razões estratégicas e éticas:

  • Proteção da Reputação: Um vazamento de dados ou uma falha na proteção da privacidade pode destruir a reputação de um escritório em questão de horas, levando à perda de clientes e à desconfiança do mercado.
  • Confiança do Cliente: Clientes buscam advogados em quem podem confiar suas informações mais sensíveis. A demonstração de conformidade com a LGPD fortalece essa confiança e serve como um diferencial competitivo.
  • Exigência de Mercado: Cada vez mais empresas, especialmente as grandes corporações, exigem que seus prestadores de serviços, incluindo escritórios de advocacia, estejam em conformidade com as leis de proteção de dados. Sem isso, contratos podem ser perdidos.
  • Devedor Ético e Legal: A proteção dos dados pessoais é um direito fundamental. Para um profissional do Direito, zelar por esses direitos é uma obrigação que transcende a mera adequação regulatória, estando ligada à própria essência da advocacia.
  • Prevenção de Litígios: Investir em conformidade agora é muito mais barato do que enfrentar processos judiciais, multas e custos de remediação decorrentes de um incidente de segurança.

A LGPD é, portanto, um convite à modernização e à excelência na prática jurídica. Não se trata de um fardo, mas de uma oportunidade para fortalecer a segurança, a ética e a relação de confiança com o cliente.

Conclusão

A LGPD em escritórios de advocacia é uma realidade complexa e desafiadora, mas sua compreensão e aplicação são vitais. A análise da jurisprudência, ainda em desenvolvimento, já aponta para a responsabilização daqueles que não tomam as devidas precauções. O tratamento de dados no ambiente jurídico exige não apenas conhecimento técnico, mas também uma mudança de mentalidade e a adoção de processos rigorosos de segurança e transparência.

Os advogados são guardiões da lei e dos direitos de seus clientes. Incorporar a proteção de dados na rotina do escritório é mais do que cumprir uma norma; é reafirmar o compromisso com a ética, a segurança e a modernidade na prestação de serviços jurídicos. O futuro da advocacia passa, inevitavelmente, pela conformidade com a LGPD.

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